O que está ruim ainda vai piorar

Editorial


“Da Vale do Rio Doce, o Espírito Santo fica apenas com o apito do trem e a poeira do minério”.

A frase foi cunhada nos anos 1960 pelo ex-governador Christiano Dias Lopes e figura no Google, o maior e mais conceituado site de buscas da internet, como emblema de uma economia que espelha o paradoxo da globalização em terras capixabas.
Como referência desse tipo de má exploração das potencialidades do Estado, o Google remete os interessados no assunto para um artigo do jornalista Geraldo Hasse, publicado no primeiro número da revista Século, em fevereiro de 2000, sob o título geral de “Economia paradoxal”.

O artigo de Hasse coloca o problema nos seguintes termos: enquanto as grandes companhias prosperam sem parar no Espírito Santo, explorando sua privilegiada localização geográfica, o Estado não tem recursos para gerir a máquina pública, dar segurança à população ou cuidar do meio ambiente, encarado como terra de ninguém por ricos e pobres

É neste cenário que a Vale vem se expandindo por aqui, como mostra matéria desta edição sobre a queda do ex-todo-poderoso executivo da empresa Roger Agnelli. Ele é o retrato fiel do empresário que Christiano retratou em sua frase e cuja atuação Gealdo Hasse detalhou em seu artigo-referência.

Lembra ele que a implantação desses megaprojetos, todos orientados para a exportação, criou no Espírito Santo uma espécie de condomínio de grandes companhias sem plena identificação com os problemas da administração do Estado.

E complementa com a seguinte observação: o elevado grau de abertura internacional da economia capixaba foi reforçado nos anos 90 pela expansão das importações, fortalecendo-se com isso um grupo de companhias que recebem incentivos financeiros para operar nos portos locais. Como a exportação gera divisas, mas não tributos, e os impostos decorrentes da importação beneficiam mais a União do que o Tesouro estadual, o Espírito Santo vive um paradoxo: moderno e bem equipado, exibe a aparência de uma potência exportadora-importadora que, no entanto, não arrecada o suficiente para pagar dignamente ao seu funcionalismo, nem para dar conta do caos nas áreas de saúde e segurança. Assim, é como se houvesse dois estados.

No artigo de Hasse desfilam, ao lado da Vale, todos os grupos que nos oito anos de governo Hartung se beneficiaram dessa política de internacionalização da economia e penalização da sociedade. “Essencialmente dependente do mercado internacional” – registra o jornalista –, “o Espírito Santo construiu uma economia de grandes negócios privados e baixas receitas públicas. Uma economia dual, não homogênea, contraditória até.”

De onde se conclui que, passados mais de cinco décadas da publicação da frase de Christiano, não só perdura o mesmo quadro de descalabro que a inspirou como se constata ser um quadro que se agrava a cada gestão econômica do Estado pelos representantes do sistema que gerou a distorção.

Ou seja, o que já era ruim, tende a piorar com o passar do tempo. A entrada em funcionamento desse novo projeto da Vale em Anchieta vai comprovar esta dura e terrível verdade.

04/04/2011
http://www.seculodiario.com.br/exibir_not_coluna.asp?id=4146

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